domingo, 20 de dezembro de 2009

MEU NATAL INESQUECÍVEL

Era 24 de Dezembro, por volta das 18:30h. Naquela momento eu estava acelerada a secar os cabelos, com os minutos contados para chegar à casa espírita onde faria uma apresentação com o coral,  no culto de Natal. Havia ganhado o direito de executar um solo, acompanhada de um colega violonista. Era meu primeiro solo; estava exultante além de muito tensa.

O telefone tocou. Um dos meus filhos atendeu e a voz do outro lado pediu para falar com a dona da casa. Quando atendi,  uma senhora falou:
- Desculpe incomodar a esta hora e neste dia. Estou num orelhão,  disquei aleatoriamente o número que me veio à cabeça e caiu em sua casa. O problema é que tenho uma família muito pobre e prometi à meus netos que faria um almoço especial amanhã e até o momento nada tenho para cumprir minha promessa. Para falar a verdade, não tenho nem para o almoço básico de qualquer dia. A senhora não me conhece, eu sei, mas  gostaria muito de poder contar com sua ajuda.

Confesso ter ficado sem palavras. Ao mesmo tempo, um sentimento diferente manifestou-se em  meu coração, tomando o lugar da melancolia que sempre o assola nas proximidades dos festejos de fim de ano. Perguntei àquela senhora em que bairro morada e ele me indicou um da região noroeste da Capital. De antemão, avisou que se eu não pudesse me deslocar até lá ela me encontraria no terminal da Praça A,  em Campinas. Assim combinamos um encontro para o dia seguinte, 25 de dezembro,  às 09:00h.

À partir daquele momento empreendi uma corrida contra o tempo. Fui verificar o que possuía no freezer, dispensa, para que pudesse montar uma cesta natalina digna. Além disso, havia perguntado à senhora quantos netos possuía, sexo e idades. Quis providenciar também  alguns brinquedos e para tanto, recorri aos armários dos meus filhos que auxiliavam-me na escolha daquilo que podia ser doado. Como não tinha todo o necessário, fiz ainda uma pequena lista para que meu marido corresse ao supermercado, adquirindo o complemento. Após essas providências, fui a apresentação do coral, juntamente com minha família assistí o culto natalino, participamos de uma modesta ceia  na residência de minha irmã e retornamos para casa, onde eu ainda embalaria as doações, cuidando, especialmente,  dos pacotes de brinquedos para as crianças.

No dia 25 de Dezembro, nos dirigimos à praça A no horário combinado. Paramos o carro nas mediações e fui em busca da senhora,  da qual desconhecia qualquer detalhe da fisionomia. Ao atravessar a rua que circundava à praça, vislumbrei a figura de uma idosa  humilde, próxima à catraca de entrada, segurando a mão de um menino. Meu coração disparou, identificando com seus olhos  aquela que havia ligado na noite anterior. Nos cumprimentamos e eu os guiei até onde o carro se encontrava estacionado. Apresentei meus filhos,  meu marido e abri o porta-malas do carro cheio de  sacolas com os donativos. Aquela senhora e seu neto caíram em pranto. Haviam imaginado que eu doaria somente gêneros alimentícios para o almoço daquele dia. Ficamos tomados pela emoção. Perguntei se não queria que a levássemos em casa, pois seria difícil conduzir  tantas sacolas através do transporte coletivo.  Ela agradeceu e disse que eu já tinha feito muito, explicando que morava próximo à parada do ônibus do bairro. Buscaria ajuda lá. Auxiliamos na condução  dos donativos até a entrada do terminal e nos despedimos. Ela não se cansava de agradecer a nós pela generosidade. Eu não me cansava de agradecer a Deus pela oportunidade de ser útil, de amenizar no  meu coração aquela sensação de vazio.

Naquele ano, tive um  Natal feliz,  embora  no  meu íntimo persistisse o desejo que,  momentos como aquele e tantos outras semelhantes, comuns em nosso cotidiano,   fossem banidos de uma sociedade constituída de irmãos, filhos do mesmo Pai. Por muito tempo, a imagem daquela senhora e seu neto, num misto de risos e lágrimas, provocavam um aperto em minha garganta. O mesmo que senti agora, passados tantos anos, relatando meu conto de Natal.

"Um jeito mais manso de ser e falar
Mais calma, mais tempo pra gente se dar.
Me diz porque só no Natal é assim?
Que bom se ele nunca tivesse mais fim...


Que o Natal comece no seu coração,
Que seja pra todos, sem ter distinção.
Um gesto, um sorriso, um abraço, o que for,
O melhor presente é sempre o amor...

Se a gente é capaz de espalhar alegria,
Se a gente é capaz de toda essa magia,
Eu tenho certeza que a gente podia
Fazer com que fosse Natal todo dia."
(Trechos da música Natal Todo Dia - Roupa Nova)

2 comentários:

  1. Amo tudo que voce escreve e tenho o maior orgulho em ser sua amiga e ver como voce ta diferente, uma pessoa fortalecida, corajosa, que esta enfrentando a vida de frente. Continue sempre assim amiga. Feliz Ano Novo amiga!

    ResponderExcluir
  2. O conto está dum realismo que, se não é crónica de algo acontecido, vale por ter sido. Beleza!

    ResponderExcluir